Isto é muito conhecido. O rabo do cavalo abana as moscas mas não as mata, só as afasta.
O tosador corta a lã do carneiro, que só faz crescer de novo. Os políticos roubam, são pegos e se afastam dos ses cargos, para depois os assumirem de novo, de outro partido.
A vida é assim. Não dá pra mudar. Bobo é quem acha que muda. Quanto a mim, me divirto com o que tenho, porque eu penso que apesar de imutável, do ponto de vista individual ela é curta, e temos o dever em testarmos suas possibilidades enquanto dela tivermos um naco.
Vejamos. Um dia eu estava almoçando em frente à Assembléia Legislativa, quando escutei despretensiosamente o papo da mesa do lado. Era um político e um assessor, falando sobre um escândalo em que o primeiro estava envolvido. O assessor tentava acalmá-lo, dizendo que isso tudo era uma grande tormenta, e que logo tudo passava. O político, visivelmente sensibilizado, fazia muxoxo de criança com a boquinha, dizendo:
-Você acha?
O assessor fez que sim com a cabeça e o abraçou, dando tapinhas em suas costas, acalentando o homem angustiado:
-Calma, vai passar. Não existe pessoa mais honesta do que o senhor nesse estado de São Paulo. E todo mundo sabe disso.
O homenzarrão de sessenta anos de terno creme, cabelos brancos compridos penteados de forma que cobrisse sua calvície, olhou-o com olhos de criança e apenas assentiu com a cabeça.
-Obrigado, meu amigo. São dessas palavras que eu preciso nesse momento de ataque dos inimigos.
O assessor levantou-se e pediu cigarros para o caixa, que disse:
-O senhor vai encontrá-los na banca no fim do quarteirão. Quer que eu peça para alguém ir buscar?
-Não. Vou eu mesmo. Assim respiro um pouco. Deputado, o senhor se importa?
O gordo emérito chacoalha vagarosamente a cabeça, com pesar, e por fim põe as duas mãos na mesa num esforço para levantar-se de sua cadeira. Durante o processo diz:
-Pode ir Moreira, que eu aproveito e vou até o banheiro.
O assessor saiu sem olhar para trás, demonstrando cansaço por esses dias temerosos de pagar o silêncio de testemunhas, intimidar discidentes, propinar a mídia para notícias obsequiosas em favor do seu patrão.
Quanto a mim, dei mais uma garfada no meu bife mal passado, e olhei para a minha direita na mesa, onde eu tinha um saco de quase 500 gramas em moedas de troco baixo que eu iria usar para pagar a conta da refeição. Mas daí tive uma idéia incrível, e pensei poder utilizá-las uma vez mais antes de passar elas para a frente.
Tão logo o Deputado entrou no banheiro, atravessando a porta de mola, peguei meu saco de moedas e entrei atrás dele. Ele estava tentando achar seu pinto naquela confusão obesa de abrir zíperes e abaixar a calça até o joelho e posicionar-se correto no mictório. A marmota errou a mira na porcelana, urinando todo o chão, com respingos repulsivos escorrendo na própria perna. O pior da cena era sua bunda branca e flácida de fora, com pelos esparsos e espinhas que mais pareciam pústulas.
Diziam os jornais que ele pagava pensão para uma modelo de dezenove anos. Nojento. Não pude mais perder tempo. Girando o saco de moedas no ar, acertei um golpe em sua nuca, escutando um crack e então o baque do homenzarrão caindo sobreo próprio mijo, não antes de bater o queijo no mictório e partí-lo em fragmentos. No chão, desferia vários golpes com o saco, sentindo seu corpo tremular em ondas de banha. Sua cabeça fazia um barulho oco a cada pancada acertada, e o sangue formou uma poça negra no chão, levantando no ar seu cheiro característico junto com a urina e os produtos baratos de limpeza. Já com o braço dolorido de tanta porrada, ofegante encostei as costas na parede de azulejos brancos encardidos e procurei no bolso um cigarro. Dei dois tragos longos, e então abri a torneira da pia, molhei as mãos e arrumei o cabelo com a humidade. Então apaguei o cigarro na orelha do cadáver de bruços, observando o paletó dpuxado para um lado, sua camisa para o outro, deixando as costas peludas expostas como sua grande bunda branca. O porcalhão tinha se cagado inteiro, esse nojento. Nem pra morrer com dignidade prestava. Virei-me e abri a porta rotatória, e fui até o caixa com meu saquinho de moedas pingando sangue.
Lá estava o assessor e o dono do estabelecimento, que me olhavam estupefados.Despejei as moedas no balcão, e disse que não precisava contar, que o dinheiro dava para pagar o almoço de quinze reais.
-Creio ter uns dezessete reais em moeda, pode ficar com o troco - eu disse.
O assessor, ainda não recuperado da situação toda, falou:
-Tem certeza que ele está morto? Não podemos correr risco algum.
-Ah, meu amigo, ele está bem mortinho, posso lhe garantir. - eu disse, dando-lhe um tapinha cortês em seu ombro e pegando meu rumo para o escritório.
Após andar alguns quarteirões, escutei ao longe o barulho de diversas sirenes. Polícia, ambulância, o caralho a quatro. Diziam no noticiário que não fora um mero assalto, que aquilo era obra de ativistas fanáticos da oposição. Uma manifestação em comoção ao homem ilibado que tinha sido covardemente assassinado fora marcado na Paulista. Seu partido, que estava sendo investigado, agora tinha uma linha de defesa: estava salvo. Agora eles tinham um mártir. Quanto a mim, foda-se. Não gosto de política. nem de futebol, tão pouco religião ou de analizar o caráter da humanidade.
Eu só quero é ver o oco.
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