terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Desolado

    Refugo. Tudo o que sobrou da sua vida de bagunça e ócio, violência e ansiedade tediosa. Refugo.
    Náusea de ser resto de dejetos no azulejo empardecido vizinho da latrina do boteco de estrada. E a vida é eterno enjôo para o incompetente: não era burro o suficiente para ser inofensivo, nem esperto para ir embora após a mágoa generalizada: ficava até apanhar, e sofria o ostracismo com a vergonha de se manter marginal àqueles que machucou.
    Não ia embora. Fedia à malcriação, e seus filhos, que os assim chamo por pô-los ele ao mundo, o destratavam, mal saiam das fraldas.
    Sua mãe sofria de desgosto, mas não o suficiente para ser levada por Deus. Ficava lá, se esgueirando embrulhada numa coberta, sustentando-o com pão, cachaça e palavras de juízo. Qual o quê, ficava com a comida e a aguardente, e em sua embriaguês estapeava e culpava a pobre mulher. Aqui se paga, dizia, e se fiz, foi por você, velha maldita. Em qual situação resolveu pôr-me nessa miséria de mundo! Vadia! Amaldiçoada!
   .... e chorava. Chorava muito. E cobria sua ressaca com cabelo penteado pra trás, parafina e roupinha bem passada. Pedindo perdão pra tudo e todos, como o mais sofredor dos seres. Mas quem de soslaio o olhasse clinicamente, via no seu olhar de cenho a maldade. Hipocrisia dos vermes.
    Escarneado seja, refugo!

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