quinta-feira, 29 de outubro de 2020

foda-se a espécie humana

 Dor de cabeça.

comprei um termômetro, mas deu 36.7.

agora estou sozinho em casa,

na véspera das minhas férias.

as ações caem quase 6%

aquelas mesmas que eu não vendi.

e a C está tentando se dar bem no emprego novo,

estudando lá,

na casa dela.

tomei relaxante muscular,

um analgésico,

estou com o ventilador ligado no 2.

e o mal estar não passa.

seria covid?

ou percepção de que a vida está fora dos trilhos?

acabei hoje o alquimista de Paulo Coelho.

o que me fez pensar…

será que eu estou seguindo minha lenda pessoal?

assisti ao clássico de 62 carnival of souls.

no final a moça era morta,

e os espectros nas janelas nos assombram

até hoje no Netflix.

tem coisa que é clássico, e por isso é copiado,

e tem coisa que é copiado,

porque as pessoa tem preguiça de ler algo novo no livro de receita

e acaba por requentar a mesma polenta com frango de sempre.

eu queria não requentar nada.

mas como dizem por aí, as vezes a gente precisa

estudar os clássicos, antes de bater as nossas asas.

eu queria viajar.

pra longe.

tipo, uma praia deserta onde a água fosse azul

e a cerveja fosse gelada,

e de preferência pagável,

e que a sombra do guarda-sol

não mudasse muito de posição enquanto eu brincasse com a areia

entre os dedos do meu pé.

queria um short, um boné e um óculos de sol,

sentir a maresia,

o cheiro do protetor,

e simplesmente me embebedar,

até quando Deus quisesse.

mas, no entanto

estou no meu quarto,

possivelmente com covid,

(a Europa toda está novamente com covid),

e eu não tenho outra alternativa

que não a de me entreter na velha cidade grande de sempre.

mas não faz mal.

eu posso lidar com isso.

certamente que posso.

não sou mais adolescente.

não preciso mais de amigos pra tomar minha cerveja,

não preciso de academia pra pegar meus pesos,

não preciso de palhaço fazendo careta pra rir.

aliás, sou autossuficiente em risadas.

rio sozinho, tudo dia.

as vezes me sento no sofá do meu apartamento,

de frente para a televisão,

e minha parede amarela,

a que fica atrás da televisão,

(porque as outras são cor de gelo),

e rio sozinho.

não soa natural no começo,

e nem é pra soar.

eu começo de forma tímida,

rá, rá, rá,

e o misto do descompasso com a timidez

soa hilário, e eu acabo rindo de fato.

as vezes me esbaldo em gargalhada,

e me pergunto o que o meu vizinho de parede

acha de mim.

acha que sou bobo?

acha que assisto comédia?

eu odeio comédia. filme, livro, meme…

mas eu não ligo dele achar que assisto comédia.

melhor que ele imaginar que sou um maldito sociopata esquisito.

daqueles que guardam pedaços de cadáver na geladeira.

deixa ele achar que assisto chaves.

eu não preciso provar nada pra ninguém.

olha só pra esse blog.

vazio.

sem leitores.

nem eu mesmo leio o que escrevo.

gosto da ação.

gosto da verve.

gosto do pulsar das teclinhas nos meus dedos.

mas não dou a mínima para o que eu escrevo.

já tentei reler alguma coisa.

já tentei inclusive mexer em algo que escrevi,

mas não deu muito certo.

ficou uma bosta.

porque minhas ideias vem uma encima da outra,

elas encavalam

e lapidar ideia velha funciona pra mim

como passar espanador no touro do wall street.

deixa o tourinho lá empoeirando,

que as mãos dos turistas removem sozinhas o pó.

então

já deixo claro

esse texto,

ou qualquer outro,

não, será, revisad,o

ontem, eu briguei com o mundo.

sabe, o trivial,

quando você discorda da forma como todos levam a vida,

trumpbolsonaroamazôniacovid e tal,

e resolve simplesmente fingir que não é mais parte do time,

sabe o que quero dizer?

da humanidade.

não sou mais humano,

e ponto final.

o que pode acontecer, se eu simplesmente me considerar não humano?

ainda posso regar minhas plantas?

posso andar nas ruas,

beijar a bunda das estátuas de mármore no louvre,

comer o cu do saci nas bodas da meia noite?

se eu posso,

então, não vejo o porque de ter que me considerar ser humano.

sou um eremita da minha espécie.

e ponto final.




quarta-feira, 11 de setembro de 2019

segunda-feira, 28 de março de 2016

Demonstração macabra de amor

Era sábado à tarde, e todos os garotos que considerava meus amigos saíram para alguma festa e não me convidaram. Pus uma roupa bacana e saí de casa rumo a lugar nenhum, despedindo-me da minha mãe sem contar a verdade, afinal de contas não queria deixá-la preocupada.
Dei algumas voltas nos quarteirões próximos, observando outros grupos de garotos que tramavam seus passeios noturnos, tomando a devida precaução de não me deixar ser visto, sobre risco de arrumar confusão, coisa de cidade pequena.
Quando percebi que alguém olhava pra mim, saía de lado, fingindo distrair-me com uma pedra, que chutava por trinta ou quarenta metros, até uma esquina furtiva.
A tarde já caía em noite quando a vi me observando: é algo estranho para um observador por si só ser o observado, mas havia algo além.
A menina trajava farrapos acinzentados e tinha grandes olhos melancólicos que me acompanhavam desde lá sabe-se quando.
Aparentemente evitava minha percepção de um ser observado até aquele momento, quando resolveu revelar-se para mim com sua penetrante fixação. Com braços relaxados e roupas muito gastas, mas não sujas, manteve-se imóvel mesmo quando cheguei a um braço de distância com o punho levantado ameaçando espancá-la pelo atrevimento.
Percebendo que meu blefe fora em vão e desmascarado como um covarde sem condições de nem ao menos enxotar uma menina enxerida, baixei os olhos e ameacei ir embora. Ela então levantou uma das mãos e tocou em meu ombro, dizendo, “Espere, quero lhe mostrar uma coisa!”.
Curioso, seguia por mais ou menos 200 metros ladeira acima até o cemitério da Paz, no topo do morro. Mas não estávamos na rua que dava para o portão principal, mas em uma vicinal onde hoje fica o velório municipal. Ela fez sinal para que eu pulasse o muro, que naquela parte é baixo.
Assustado pelo pedido, mas curioso e incapacitado de fazer feio perante uma menina, pulei a parede de um metro e setenta, não antes de ralar um pouco a barriga. Quando olhei para trás, vi que ela me seguia com aparente tranquilidade, talvez porque já fizesse isso mais vezes. Estranho, pensei, pois era vizinha de um quarteirão do cemitério e não lembro de tê-la visto antes.
Ela me guiou até um túmulo de mármore cheio de fotos antigas e contemporâneas, depois parou em posição de sentido equivalente a quando a vi pela primeira vez. Já era noite, mas as luzes dos postes das ruas próximas iluminavam bem o ambiente.
Ficamos assim não sei quanto tempo, uma sensação de horas, mas creio que não tenha mais que cinco minutos (tanto tempo assim?).
Daí ela me contou que aquele era o túmulo da família dela, caso ela tivesse uma família.
- Meu nome é Nora. Só Nora porque não fui registrada, e ninguém cuidou de mim. Mas está vendo aquela mulher bonita ali? Ao lado daquele gordo de bigode? É a minha mãe. E está vendo aquele moço bonito ali escrito padre na frente do nome? É o meu pai.
-Mas como você sabe?
-Não vou te contar. Mas eu sei.
-Não entendo.
-Não precisa. Basta saber que eles estão todos juntos em algum lugar, minha família, e eu vou morrer como vivi, sozinha. E disse isso com lágrimas nos olhos.
-Desculpa.
-Pelo quê? Não tem que me consolar. Tem que me ajudar.
-Como
-Me ajude a entrar lá. Deitar em um dos espaços, e dormir com eles. Daí fico com a minha família para sempre.
-Você está louca?
Eu olhei bem pra ela, e parecia bem determinada.
-Não.
Ficamos em silêncio. Talvez ela estivesse certa, vi isso num filme uma vez.
-E o que quer que eu faça? Perguntei, empenhado em cooperar.
-Me ajude a abrir o buraco de uma das lápides e me feche lá, mas preciso que me prometa uma coisa...
-O quê?
-Que não me deixará desistir. Mesmo que eu insista. Muito.
-É difícil. Tenho coração mole pra súplicas. (lógico que não falei assim, mas é como me lembro.)
-Eu confio em você. Pode fazer isso por mim?
-Vamos abrir. Disse isso e forcei a portinhola que dava para o vão cheio de lajes preenchidas com cimento.
As mais novas estavam duras, mas as mais baixas soltavam com o cutucão de uma vareta que encontrei caída de uma árvore. Não nos incomodamos em saber qual era a gaveta que de fato guardava sua mãe ou seu pai, afinal estar com a família era o fundamental da nossa missão.
Enquanto me concentrei em retirar metade da parede de tijolos em ruínas revelando um esqueleto com cheiro característico tumular, Nora apareceu na abertura com um papelão que ela havia arrastado sei lá de onde com cimento fresco de alguma obra do cemitério. Chamei-a para dentro e mostrei o vão da gaveta que havia aberto com certo orgulho. Ela olhou-me com seus tristes olhos grandes nariz a nariz, e nessa eternidade pude sentir algo estranho que mais velho rotulei de amor. Ela me abraçou e deu um beijo no meu rosto, e eu me virei um pouco envergonhado falando:
- Vamos.
-Sim. Obrigada!
-Rápido, antes que venha alguém!
Ela se enfiou na gaveta, praticamente de conchinha com o irreconhecível habitante funesto daquele espaço.
Comecei então meu trabalho, juntando pouco a pouco os tijolos e os unindo com o cimento que Nora havia arranjado, com os olhos dela sempre me fitando, melancólicos mas satisfeitos, como se esperasse isso há tempos.
Faltando seu busto e cabeça para terminar, ela rompeu o silêncio:
-Você é o meu anjo, sabia?
-Não sou não. E falei com os olhos marejados, gaguejando.
-Por quê?
-Porque se eu fosse seu anjo, te tirava daí e te levava embora.
Novo silêncio, novamente Nora o quebrou:
-Agradeço por compreender.
Fiz sim com a cabeça, e continuei com a obra. As horas foram se passando e os tijolos foram novamente empilhados. Faltava só cobrir sua cabeça.
Foi então que tive que provar meu heroísmo e comprometimento, frente ao perigo.
Nora começou a entrar em desespero, e sentir claustrofobia. Começou a respirar rápido e gemeu baixinho, desesperada:
-Por favor, para, me tira daqui, eu quero sair, eu não quero mais.
Fiquei impassível, escondendo uma lágrima do olho.
Ela começou então a se debater e gritar, atrapalhando meu trabalho e ameaçando acordar toda a vizinhança.
Repentinamente, escutei passos ao longe lá fora, e vi o rastro de uma lanterna que vinha de longe, mas podia chegar antes do serviço acabar. Nora escutou o som de pessoas se aproximando do lado externo e gritou:
-Aqui, aqui, socorro, ele quer me matar!
Num relance de agilidade, a adrenalina fez com que eu pensasse rápido e, segurando um tijolo com a mão direita, desferi-lhe dois ou três golpes em sua cabeça, deixando-a inconsciente.
Minutos depois, o coveiro passou através da ruazinha do túmulo que nos encontrávamos, confuso por não achar a origem dos barulhos que o acordara. Pouco depois, foi embora.
Em quinze minutos, terminei a última fenda que separava Nora e sua família do mundo externo. Linda, não pude ver seus olhos uma última vez graças ao sangue empapado que coagulara em sua face, fazendo uma máscara mortuária com seu cabelo negro.
Beijei minha mão e toquei sua testa, para depois fechar o último tijolo, com um nó na garganta.
Os primeiros raios de sol da manhã despontavam quando fechei a portinhola do túmulo, cansado, mas com senso de dever cumprido. Não sei onde a família de Nora se encontra agora, mas com certeza ela está com eles.
-o-
Às vezes sonho com Nora, e fantasio seu espírito vindo até mim a noite agradecer por minha ajuda. Outras vezes tenho alguns pesadelos malucos, sugerindo que ela jamais quis de fato ser enterrada viva. Mas eu sei que isso é bobagem, porque eu sei como é a solidão, e sei como ela castiga e faz doer por dentro. Às vezes penso que seria bom se eu tivesse alguma mão amiga que poderia me amparar como amparei Nora.
Mas, ao que tudo indica, eu não tenho amigos. Nora era minha única amiga. Então, penso eu, no final, eu fiquei... feliz. Afinal, felicidade se compartilha com quem se ama, e eu a compartilhei cada momento daquela noite com Nora.

sexta-feira, 11 de março de 2016

Todas as autoridades públicas e ex-integrantes de cargos eletivos deveriam ter foro privilegiado, dado à importância simbólica ao país. E pelo mesmo motivo, se condenados, pena em quádruplo.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Diversão com saco de moedas.

Isto é muito conhecido. O rabo do cavalo abana as moscas mas não as mata, só as afasta.
O tosador corta a lã do carneiro, que só faz crescer de novo. Os políticos roubam, são pegos e se afastam dos ses cargos, para depois os assumirem de novo, de outro partido.

A vida é assim. Não dá pra mudar. Bobo é quem acha que muda. Quanto a mim, me divirto com o que tenho, porque eu penso que apesar de imutável, do ponto de vista individual ela é curta, e temos o dever em testarmos suas possibilidades enquanto dela tivermos um naco.

Vejamos. Um dia eu estava almoçando em frente à Assembléia Legislativa, quando escutei despretensiosamente o papo da mesa do lado. Era um político e um assessor, falando sobre um escândalo em que o primeiro estava envolvido. O assessor tentava acalmá-lo, dizendo que isso tudo era uma grande tormenta, e que logo tudo passava. O político, visivelmente sensibilizado, fazia muxoxo de criança com a boquinha, dizendo:
-Você acha?
O assessor fez que sim com a cabeça e o abraçou, dando tapinhas em suas costas, acalentando o homem angustiado:
-Calma, vai passar. Não existe pessoa mais honesta do que o senhor nesse estado de São Paulo. E todo mundo sabe disso.
O homenzarrão de sessenta anos de terno creme, cabelos brancos compridos penteados de forma que cobrisse sua calvície, olhou-o com olhos de criança e apenas assentiu com a cabeça.
-Obrigado, meu amigo. São dessas palavras que eu preciso nesse momento de ataque dos inimigos.
O assessor levantou-se e pediu cigarros para o caixa, que disse:
-O senhor vai encontrá-los na banca no fim do quarteirão. Quer que eu peça para alguém ir buscar?
-Não. Vou eu mesmo. Assim respiro um pouco. Deputado, o senhor se importa?
O gordo emérito chacoalha vagarosamente a cabeça, com pesar, e por fim põe as duas mãos na mesa num esforço para levantar-se de sua cadeira. Durante o processo diz:
-Pode ir Moreira, que eu aproveito e vou até o banheiro.
O assessor saiu sem olhar para trás, demonstrando cansaço por esses dias temerosos de pagar o silêncio de testemunhas, intimidar discidentes, propinar a mídia para notícias obsequiosas em favor do seu patrão.
Quanto a mim, dei mais uma garfada no meu bife mal passado, e olhei para a minha direita na mesa, onde eu tinha um saco de quase 500 gramas em moedas de troco baixo que eu iria usar para pagar a conta da refeição. Mas daí tive uma idéia incrível, e pensei poder utilizá-las uma vez mais antes de passar elas para a frente.
Tão logo o Deputado entrou no banheiro, atravessando a porta de mola, peguei meu saco de moedas e entrei atrás dele. Ele estava tentando achar seu pinto naquela confusão obesa de abrir zíperes e abaixar a calça até o joelho e posicionar-se correto no mictório. A marmota errou a mira na porcelana, urinando todo o chão, com respingos repulsivos escorrendo na própria perna. O pior da cena era sua bunda branca e flácida de fora, com pelos esparsos e espinhas que mais pareciam pústulas.
Diziam os jornais que ele pagava pensão para uma modelo de dezenove anos. Nojento. Não pude mais perder tempo. Girando o saco de moedas no ar, acertei um golpe em sua nuca, escutando um crack e então o baque do homenzarrão caindo sobreo próprio mijo, não antes de bater o queijo no mictório e partí-lo em fragmentos. No chão, desferia vários golpes com o saco, sentindo seu corpo tremular em ondas de banha. Sua cabeça fazia um barulho oco a cada pancada acertada, e o sangue formou uma poça negra no chão, levantando no ar seu cheiro característico junto com a urina e os produtos baratos de limpeza. Já com o braço dolorido de tanta porrada, ofegante encostei as costas na parede de azulejos brancos encardidos e procurei no bolso um cigarro. Dei dois tragos longos, e então abri a torneira da pia, molhei as mãos e arrumei o cabelo com a humidade. Então apaguei o cigarro na orelha do cadáver de bruços, observando o paletó dpuxado para um lado, sua camisa para o outro, deixando as costas peludas expostas como sua grande bunda branca. O porcalhão tinha se cagado inteiro, esse nojento. Nem pra morrer com dignidade prestava. Virei-me e abri a porta rotatória, e fui até o caixa com meu saquinho de moedas pingando sangue.
Lá estava o assessor e o dono do estabelecimento, que me olhavam estupefados.Despejei as moedas no balcão, e disse que não precisava contar, que o dinheiro dava para pagar o almoço de quinze reais.
-Creio ter uns dezessete reais em moeda, pode ficar com o troco - eu disse.
O assessor, ainda não recuperado da situação toda, falou:
-Tem certeza que ele está morto? Não podemos correr risco algum.
-Ah, meu amigo, ele está bem mortinho, posso lhe garantir. - eu disse, dando-lhe um tapinha cortês em seu ombro e pegando meu rumo para o escritório.
Após andar alguns quarteirões, escutei ao longe o barulho de diversas sirenes. Polícia, ambulância, o caralho a quatro. Diziam no noticiário que não fora um mero assalto, que aquilo era obra de ativistas fanáticos da oposição. Uma manifestação em comoção ao homem ilibado que tinha sido covardemente assassinado fora marcado na Paulista. Seu partido, que estava sendo investigado, agora tinha uma linha de defesa: estava salvo. Agora eles tinham um mártir. Quanto a mim, foda-se. Não gosto de política. nem de futebol, tão pouco religião ou de analizar o caráter da humanidade.
Eu só quero é ver o oco.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

O que os outros pensam

José conversava na portaria com Pedro. Ele tinha acabado de chegar do trabalho, e foi jogar conversa fora com o zelador. Os dois falavam sobre política e policiais corruptos, enfim, coisas que estavam nas páginas do jornal do dia, quando Pedro, que era o zelador do prédio, disse que a cobertura da ala norte do prédio estava vaga, e disse que o proprietário iria se mudar do país e estava vendendo a preço de barganha. José então disse:
-Mas sério? Meu sonho era morar naquela cobertura, nem que fosse por um dia. Deve ter uma ótima vista!
-Excelente, dá pra ver até o parque de lá, - animou-se João - e ele está fazendo qualquer negócio. Se você oferecer o seu apartamento de entrada e financiar o resto ele iria adorar, porque seria bem mais fácil vender o seu. Nesses tempos de crise…
-Nem me fale. Mas eu acho que tenho fôlego pra um pequeno financiamento. Afinal de contas sou solteiro, aquela cobertura é o sonho da minha vida inteira e... ei, espera um pouquinho, aquela lá que vem vindo não é a dra. Maria?
Maria vinha da rua que dava para a farmácia. Estava bem arrumada, de cabelo feito e muito bem maquiada, pensou José.  Para uma mulher que pouco se cuidava, parecia que as coisas iam bem para ela. Ela tinha terminado um noivado a pouco mais de seis anos, e durante esse tempo pouco se importava consigo mesma, afundando-se de cabeça no trabalho e no conselho do prédio, para infelicidade dos moradores.
-Isso é um ótimo sinal. - pensou José - Posso aproveitar para comentar algo sobre sua aparência, e talvez ela se esqueça das mazelas passadas.
Apesar de vizinhos, eles não se viam há três anos. Isso acontecia pelos horários diferentes, José se justificava. Ele só não sabia qual seria a postura dela em relação a ele naquele momento, porque das últimas vezes que se viram, tiveram alguns desentendimentos devido a assuntos do dia a dia no prédio. Ele já fora síndico, e ela uma conselheira que criticou impiedosamente sua gestão. E ela engoliu alguns desaforos por deslizes que ela próprio havia cometido. José não tinha nada contra ela e nunca lhe guardou mágoa pelos seus destratos, mas sabia que estava lidando com uma pessoa difícil.
Maria cruzou o portão. Os dois homens pararam de conversar, e José tentou ser solícito falando primeiro:
-Boa tarde Maria!
Maria o olhou com um sorriso no rosto, mas com aquele olhar que ele já conhecia de outros carnavais.
-Você envelheceu muito durante esse tempo.
José deu um sorriso amarelo. Ficou com aquele elogio que tinha guardado para ela entalado na garganta, afinal ela o havia desarmado. Apesar de bem mais velha do que ele, talvez cinco anos, ele não estava predisposto a cair na defensiva.
-O tempo passou Maria. - recuou José.
-Mas você envelheceu demais.
-Deve ser o peso da responsabilidade. Ou talvez porque eu emagreci.
-É, responsabilidade costuma deixar marca de idade. - Maria disse isso olhando para a barriga protuberante de José, que quanto mais tentava encolhê-la, mais se ressaltava na camisa cor de pêssego-derrota.
Ela deu um novo sorriso artificial e virou-se para abrir a porta do prédio e seguir seu caminho. João e José ficaram quietos por um tempo, e depois continuaram a conversa, mas José estava com aquilo na cabeça. Que tipo de pessoa faria um comentário desses? Qual seria a intenção pura de machucar a auto-estima de alguém que nada lhe fizera?
João, percebendo que José estava pensativo, parou de comentar seu futebol ou algo parecido e se calou por um instante. Então disse:
-Ouça, meu amigo: Mário Quintana uma vez disse que não existiam pessoas boas ou más no mundo. Apenas pessoas que desejam o bem das outras. E tem também aquelas que desejam o mal. -disse isso apontando com a cabeça para a porta do prédio, e depois os dois deram um sorriso encabulado, cúmplices da humilhação imposta.
José então ficou quieto, pensando na frase. Vendo que só o tempo resolveria aquela situação embaraçosa, João pôs a mão no ombro do rapaz e o consolou:
-Você fez bem em não responder para aquela recalcada.
José concordou e deu boa tarde para o zelador. Subiu até seu andar e entrou no seu apartamento. Tirou os sapatos, ligou o ventilador, acendeu a luz da sala. Entrou no banheiro e foi dar uma olhada no espelho. Mirando-se bem, viu rugas que não vira antes no seu rosto, pés de galinha e poros abertos, além dos cravos e espinhas. Percebeu acima da testa uma entrada no seu couro cabeludo muito maior do que achava que era. E os cabelos grisalhos então? Já devia ter mais de 10 fios! A coisa estava feia. Arrancou sua roupa e se olhou no espelho. Estava gordo e mole. Tudo era só flacidez e pelancas. Não tinha nem a metade da beleza que costumava ter antigamente.
Naquela noite, José não dormiu direito. Ficou pensando nas coisas que a megera lhe falara. Parecia que seu rosto se repuxava durante a noite, e ele não conseguia dormir se imaginando carcomido por dentro.
Ele acordou na outra manhã decidido em não pensar em mais nada, a não ser na construção de uma pessoa melhor. qSe inscreveu em uma academia, contratou um personal trainer, foi até um dermatologista e a uma nutricionista. Começou um programa de natação, comia certinho e fazia seus treinos até rasgar e definir todos seus músculos. Tratou seu cabelo com cremes especiais, a pele do seu rosto e pescoço com susbtâncias que melhoravam o colágeno e o liberavam dos radicais livres. Fez limpeza completa de pele em um spa muito bem recomendado pelos profissionais da área. Em seis meses ele se olhou no espelho e sorriu, vendo um corpo perfeito, com um rosto quase sem marcas de idades e um cabelo ondulando ao vento. Ficara muito contente com o resultado de todo seu esforço e boa disposição em mudar para melhor. Então disse em voz alta, para si mesmo, com a intenção de que as paredes do seu apartamento testemunhassem o nascimento do mais novo homem:
-Agora eu, José Pereira de Aragão, recuperei a minha auto-estima!
José então começou a passear na frente do seu prédio em horários distintos. Ele queria de alguma forma encontrar Maria, a sua Nêmesis que o deixara tão aflito durante tanto tempo, e poder mostrá-la pessoalmente como ele, José, foi capaz de dar a volta por cima.
Um belo dia, após  José tornou a encontrar o zelador João e eles começaram a falar sobre amenidades das páginas do jornal daquele dia, quando ele viu Maria vindo de longe. Ele respirou fundo e estufou o peito, pensando em elogiá-la por sua aparência e saúde. Assim ela não teria outra alternativa, senão dãr o braço a torcer e fazer algum comentário positivo para ele.
Assim que ela cruzou o portão, José disse, teatral:
-Bom dia!
Maria o olhou com um sorriso no rosto, mas com aquele olhar que ele já conhecia de outros carnavaisa aquele mesmo que o assustava tanto. Sem delongas ela cuspiu:
-Bom mesmo. Comprei aquela sua cobertura dos sonhos.
-Como assim, comprou? - Arruinou-se José.
Com um sorriso artificial no rosto, afinal, Maria não era do tipo de pessoa que conseguia fingir uma expressão facial humana por muito tempo, ela se justificou, destilando seu sarcasmo vil:
-Estamos em tempos de crise, então me vendeu baratinho! Boa tarde para vocês.
-Boa tarde, Maria. - chorou José, procurando um buraco para enterrar a própria cabeça.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Amigo é pra essas coisas

José convidou Breno para uma pizza em sua casa. Ele morava em uma cobertura próximo ao centro de Belo Horizonte e gostava de compartilhar seu tempo de lazer com amigos. Breno trouxe um vinho como manda a etiqueta, mas aceitou cerveja gelada, coisa que gostava, principalmente num dia de calor como aquele.
-Breno, fiquei sabendo da sua viagem em Berlin! Parabéns, para um homem que nunca saiu do Brasil você anda bem arrojado.
-Sim, obrigado. Ando estudando alemão faz um tempo. Estou vendendo minhas coisas, vou me mudar para lá.
-Breno. Mais uma das suas eim? Quem te convenceu disso?
Breno estava tenso. Sabia que José seria impiedoso.
-Alguns amigos com quem conversei. Eles me disseram que seria ótimo morar na Europa, que as oportunidades são incriveis, além das praças, museus, as garotas...
-As garotas, Breno, as garotas!
José ria com sarcasmo enquanto levantou a cerveja fazendo um gesto de brinde.
-Breno, - continuou - A Alemanhã não é um lugar para qualquer um não meu amigo. Lá a competição é severa. O mercado de trabalho lá é acirrado, e não tem lugar pra gente despreparada. Você tem faculdade em que mesmo?
-Sou técnico em...
-Ah, meu amigo, técnico, na Alemanha? Achei que estivesse se formado numa faculdade meia boca, mas técnico? Sem chance. Eles te engoliriam lá.
-Olha José, eu acho que quem não arrisca, não petisca, e eu quero tentar mesmo assim. Afinal de contas, já vendi minhas coisas, e não tem nada que me segura aqui...
-Mas porque não falou comigo Breno, que pressa é essa? Você acha mesmo que é assim, ir, arrumar um lugarzinho, procurar um emprego e pronto acabou, já está estável, falando alemão, cheio de loiras te ligando para andar de bicicleta nos parques?
José fez um gesto de negativa com a cabeça. Formou-se um silêncio sepulcral, e José olhava para o fundo do seu copo, a cerveja já quente e sem espuma.
José continuou o seu ritual cáustico:
-Olha, não sei quem é que falou com você sobre esse papo de ir para a Alemanhã, mas não tá nada certo. Eles estão cheios de refugiados sírios lá, daqui a pouco o terrorismo vai virar uma paranóia na região e rapidinho você vai para a rua da amargura, se não acabar sendo deportado. E vou dizer, se marcar, seria ótimo para você, porque lá, desempregado, com aquele inverno rigoroso. Você já esteve na neve?
-Não - disse Breno desolado
-Ah, a neve só é linda nos filmes e nas casas dos ricos! Para quem não tem emprego, dinheiro nem qualificação, e ainda por cima é brasileiro, daí a coisa muda mesmo de figura.
Breno não suportava aquela ladainha toda. Deixou seu copo na mesa, agradeceu o convite e falou que tinha de ir embora. Por educação, lembrou-se de que tinha que buscar o cachorro da mãe no veterinário.
-Mas ainda tem pizza pra fazer meu amigo, não quer ficar mais quinze minutinhos?
-Não obrigdo, já vou.
-Pode ir então, Breno. Mas pensa no que eu disse, ok?
Breno foi embora, e de fato pensou. Pensou que José, era um canalha. Herdara a loja do seu pai e nunca precisou de fato pegar no pesado. Tinha sorte de ser um cara estudado e próspero, enquanto ele teve de ralar de garçom para pagar o colegial técnico. O cara conhecia o mundo inteiro, ia para as Bahamas, Pequim, Nova Iorque, enquanto ele, que queria um pouco daquela vida de sonhos, era escurraçado pelo amigo. Inveja, isso é o que era.
Virando uma esquina, Breno viu um mendigo pedindo comida. Viu uma garrafa de cachaça faltando dois dedos, e viu meninos atirando pedras nele, até que acertaram a garrafa. Viu a cara do homem, que tinha fome, e agora não tinha mais sua distração para aquela vida de merda. Breno enfiou as mãos no bolso, mas não tinha troco, acabou indo embora dando apenas um sorriso amarelo para o morador de rua. Da outra vez que passar deixo dinheiro, pensou. E isso lhe fez mudar seu raciocínio quanto ao que dizia José. Ele podia ser um almofadinha mala sem alça, mas era seu amigo de infância. O que José queria era alertá-lo sobre os perigos, deixar claro que as coisas eram difíceis lá fora. Mas ele tinha investido meses no seu alemão! Pensando bem, talvez não tivesse um alemão tão bom assim, e poderia passar um tremendo aperto. Breno voltou para a casa com uma opinião.

Seis meses se passaram quando José parou para tomar café numa padaria, e se surpreendeu com Breno no balcão:
-Breno, faz quanto tempo! Você sumiu! Achei que tivesse ido mesmo.
-Não, eu pensei bem, e resolvi ficar. Morar longe de BH não é pra mim.
-É, uma coisa é certo, meu amigo, você tem que ter coragem pra assumir ma posição. Eu sempre valorizei isso em você. E a oficina, desistiu?
-O Moreira já tinha contratado outro eletrecista. E com essa crise, tenho que dar graças a Deus em conseguir lavar copos aqui.
-Mas, sei lá, não estou vendo felicidade no seu olhar José. Tem certeza que não queria ir?
-Não, estou bem aqui.
-É que sabe, apesar de tudo o que te falei, pra alertar, pra chacoalhar seus ânimos, tem o outro lado. Sempre tem gente que vai, com uma mão na frente e outra atrás e se dá bem...
-José,
-...tem gente que dá a volta por cima, mesmo porque qualquer graninha que guardar lá, é em Euro, cinco vezes mais que o real do Brasil.
-José,
-...e além do mais, pra quem não tem nada a perder como você, o que é que custa arriscar?
-JOSÉ - se exaltou Breno, para espanto do amigo.
-Desculpe, Breno, é que, eu queria te dexar pra cima, você está meios caidão...
-José, me escuta.
-Sim Breno.
Breno olhou bem fundo nos olhos de José, que estava estupefado por todo aquele papelão. Viu que atrás dele limpava o chefe do balcão limpava um copo e observava a conversa, então Breno deu um respiro profundo e meneou a cabeça.
-O que vai querer, José, café puro ou com leite.
-Com leite, por gentileza.
Breno trouxe o copo para ele.
-Açúcar ou adoçante?
-Adoçante, estou de dieta.
-Aqui está.
José tomou seu café com leite silenciosamente. Pôs o dinheiro sobre o balcão, deixando uma generosa gorjeta, afinal sabia que Breno estava duro e precisava de um apoio moral. Então levantou-se e falou, já na porta da padaria.
-Breno eu vou indo então, mas pensa no que eu disse, ok?

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Star Wars no Original. Porque assistir?


Trecho retirado do site Gizmodo:

O primeiro filme da trilogia clássica de Star Wars estreou em 1977, mas, quase 40 anos depois da sua estreia, não é muito fácil conseguir assistir à versão exibida nos cinemas. Isso porque, com o passar do tempo, George Lucas foi alterando não apenas o Episódio IV – A Nova Esperança no futuro, quanto também modificou algumas coisas nos episódios V e VI.
O problema é que nem sempre essas mudanças foram positivas. E isso deixou fãs bastante irritados. Eles querem assistir à trilogia clássica da forma como ela foi concebida originalmente, não com retoques de efeitos especiais feitos décadas depois da estreia, ou com Greedo atirando primeiro. E, como fãs unidos costumam ser fortes, eles conseguiram “recuperar” a versão clássica dos filmes. Eis como você pode fazer para assistir.
O usuário Harmy do fórum originaltrilogy.com é um dos que tentou recriar a trilogia clássica no que ele chama de Despecialized Edition (quando os filmes foram relançados em 1997, George Lucas adicionou um “Special Edition” a eles. A ideia desses fãs é de “desespecializar” os filmes). Os fãs restauraram os filmes da maneira como foram exibidos no cinema a partir de colagem de cenas presentes em outras versões, incluindo uma lançada em 2008 em baixa resolução que preservava os filmes originais.

O que eu acho:

Star Wars é uma saga muito importante para quem gosta de filmes, seja porque gosta de entretenimento ou porque estuda cinema. 
Digamos que Star Wars é um ícone dos filmes Hollywoodianos, com roteiro cativante e universo ficcional muito rico, apesar dos personagens serem pouco profundos. 

Por que foram feitas mudanças? 
Porque a primeira trilogia foi feita vinte anos antes, e os três capítulos da prequela não existiam, ou eram só rascunhos. Essas pequenas modificações foram feitas para dar coesão. Também foram postos excertos em CGI (3d computadorizado) porque em 1997 era sensação. 

Essas modificações foram ruins? 
Não, pelo contrário, foram boas e assistidas pelo próprio criador da série, George Lucas, o que não a descaracterizou. 

Então porque assistir à versão original, sem ajustes ou CGI? 
Porque o estudioso de cinema, assim como o fã de carteirinha querem conhecer a concepção original, para efeito de estudos, pela nostalgia, porque é legal. 
É como se fosse uma espécie de arqueologia cinematográfica. 


O que o Harmy fez é legal? Cara, é surpreendente! Ele, como um arqueólogo que monta cacos de cerâmica para recontar a história do Egito antigo, montou a Despecialized Edition para conhecermos o Star Wars como era na origem. 

"AH, mas eu achei que ele perdeu tempo :("
Ok meu amigo, vai dar feliz aniversário no face pros seus amigos, porque você é um cara que não perde tempo pra nada nesse mundo, inclusive veio comentar nesse forum porque é super ocupado. O Harmy é um editor de mão cheia e usou o tempo dele para seu hobby, e auxiliou muitas pessoas que gostam de cinema clássico. 
Quem não curtiu, vai assistir outra coisa, só não critique o trabalho do camarada. Se curtiu, vai lá na página do cara e dá os parabéns. Não sou fã da saga Star Wars, mas gosto de cinema, e procurei a versão original para conhecer as motivações originais do George Lucas. Agradeço pelo post do GizModo. Ajudou muito! 

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Patos de pelúcia


Eu não tenho bicho de estimação. Gosto deles soltos, livres. Mas se morasse em um lugar paradisíaco, gostaria de que fosse próximo a um lago de ornitorrincos.

Meu celular tá dando pau, pica-pau.

Como é difícil lidar com os problemas de tecnologia.
Não falo sobre o seu não entendimento, mas sobre a obsolescência programada.
Você hoje compra um computador, um tablet, um celular, e pensa, uau, eu gastei um rio de dinheiro, mas vale a pena, vou poder fazer um monte de coisas com essa tecnologia nova. Você tira da caixa, tudo cheira a novo e tem visual bacana, você põe na tomada e mal consegue esperar as 4 horas para carregar a bateria.
Então liga a tela, aquelas cores vibrantes, tudo com efeitos visuais lindos, transparências, botões novos que não vê a hora de aprender a dominar! Daí fica pensando, o que eu posso fazer com esse trequinho, que seja bom pra mim, que seja produtivo?
Uma dica, não importa o que você queira fazer, apenas faça, e faça o mais rápido possível.
Porque esses brinquedinhos da modernidade têm um relojinho dentro deles, uma coisinha que trabalha como uma pequena bomba-relógio, tic-tac, tic-tac, tic-tac!
Tudo funciona às mil maravilhas, você tem orgulho e deixa seus amigos e as pessoas do metrô com inveja.
O mundo está perfeito pra você, e você se sente contente com sua mais nova aquisição. Então, você se ilude, e comete seu primeiro erro, achar que aquele aparelho é muito bom e que você vai ficar com ele por muito tempo, porque, tal qual o relógio do seu avô que você herdou, ele é de primeiríssima qualidade e vai durar horrores! Ingênua criatura!
Então está lá você, baixando vídeos do youtube, lendo documentos online, mandando feliz aniversário pelo facebook...
Mas está lá o reloginho dentro, tic-tac, tic-tac, marcando o seu tempo.
E, num belo dia, quando você menos espera e geralmente mais precisa, então esse pequeno relogio embutido dá o seu tempo pré-programado, e seu despertadorzinho explode malvadezas, feito uma pequena bomba da infelicidade.
Então as coisas param de funcionar.
Não de uma vez, claro, porque tudo foi arquitetado de uma forma maquiavélica para levá-lo a loucura.
Primeiro, você tenta mandar uma mensagem em seu Whatsapp e aparentemente seus dedos ficam mais rápidos que seu texto... você escreve, escreve e as coisas só aparecem escritas cerca de dois segundos depois. Você acha que é um probleminha pontual e vai fazer outra coisa.
Logo após, tenta abrir seu browser, e ele demora para inicializar, e quando entra, sem nenhuma explicação, aparece uma mensagem, esse aplicativo parou de funcionar e a janela fecha repentinamente.
Então, meu amigo, se prepara, porque o esse é o início de uma longa e tortuosa viagem rumo a queda sem fim em espiral rumo a frustração e impotência.
Emails que você acha que enviou não foram enviados, ou pior, foram para pessoas erradas, seus contatos somem, a bateria começa a durar menos que o comum, geralmente acabando antes, bem na hora que precisa receber uma ligação importante do seu trabalho.
Você começa a ficar irritado, tudo na sua vida parece sair do controle, afinal, você é uma pessoa do seu tempo, o que quer dizer que tudo seu se encontra de alguma forma na nuvem. Contatos, emails, sms, Twiter, Linkedn...
Então você apela para dicas de internet, apps que prometem deixar seu gadget mais rápido, dá o aparelho na mão daquele seu amigo guro de informática, leva pra técnico formatar.. e nada, parece na realidade que as coisas só vão de mal a pior.
Até que o que você começa a escutar conselhos que arrepiam até os pelos da nuca dos mais ousados... "você deveria comprar um aparelho novo!".
Como assim? Acabei de comprar essa porcaria, mal tirei ele da caixa, não aprendi nem a mexer totalmente direito as suas funcionalidades, e o pior... nem terminei de pagar as prestações!
Você luta, tenta se acostumar com toda aquela lentidão e travamento, diz que é normal, que faz parte da vida, não olha para o lado quando seu colega de trabalho conta vantagem sobre o modelo novo que acabou de comprar.
Na realidade odeia ele a cada dia mais, e pensa nele como um metido arrogante que só quer contar vantagem.
O tempo passa, as coisas andam, e você precisa trabalhar, ou quando muito, viver sua vida. E como já dissemos anteriormente, isso implica em usar a tecnologia do qual você necessita plenamento. Ou, trocando em miúdos, é completo refém!
Mas como vítimas da síndrome de Estocolmo, no qual o sequestrado se apaixona pelo sequestrador devido a todo aquele stresse emocional, você repete, quase que como um mantra, não vou voltar para trás, não vou voltar para as cavernas, meu lugar é aqui, no presente, e não nos anos 80 com agendinhas de bolso, cadernetas e fichas para orelhão!
E num péssimo dia, vindo como notícia de acompanhantes de paciente de UTI, você se pega com seu querido aparelhinho falido, desconectado, offline, ou qualquer outra desgraça que o valha.
Não importa quanto tempo dura esse ciclo todo, desde a compra do gadget, seus pequenos defeitos, grandes defeitos, até a sua completa e inequívoca falência, você sempre vai ter a impressão de que ele é a cada modelo comprado mais curto, mais dispendioso, mais claustrofobicamente incômodo.
Parabéns, meu amigo, você foi mais uma vítima da obsolescência programada.
Vão tentar te convencer que você instala porcarias demais, vão tentar culpar a humidade do clima brasileiro, vão até falar, "ah, mas o do Joãozinho ainda está inteiro, e ele comprou antes de você!".
Acredite, eles arrumam um jeito de estragar o seu aparelho. O que os fabricantes de plástico não conseguiram fazer ainda, a indústria eletrônica faz há décadas, com primazia, que é transformar o produtos deles em degradável.
E pode fazer o teste, se quiser. Tire seu aparelho na caixa, ligue-o e o introduza na rede. Então guarde ele de novo na caixa, espere uns seis meses, então abra-o, ligue-o novamente e o reconecte na internet. Voilà, você acaba de ter um aparelho deteriorado de forma relâmpago, com todos os sintomas de um bem usado, travando e dando pau em tudo, sem nem mesmo tê-lo usado!
Mas não se preocupe, para tudo há esperança. Nas lojas, agora mesmo, acabaram de lançar um modelo novo, que funciona melhor, que tem novas funcionalidades, que vai te promover a mais rica experiência em informação e entretenimento.
Prepare seu bolso, e boas compras!
Vamos consumir.
Fazer a economia girar.
Obsolescência programada.
Tomá no cu.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Como amar em tempo de chuva




É tempo de chuva nas ruas molhadas, escuras, mesmo estando tudo sendo observado pelo sol da tarde que de longe tudo vigia.

Estava eu na cama, ou no sofá, não posso detalhar com toda aquela letargia; o fato é que não tinha eu dado passo definitivo para tomar ação alguma naquele domingo ainda sem o café matinal.

Levanto nu em pelo e passeio pressentindo o misterioso e sigo por ignotos caminhos e por corredores que não me são de todo conhecidos até o que julgo ser meu objetivo final, a mulher senhora deste apartamento que maternalmente vai garantir minha alimentação.

Sigo o faro do vapor do arroz, aroma do alho refogado e dos bifes estalando em dois dedos de azeite e após esquerdas e direitas em móveis escuros e antiquados, paro um minuto em uma mesa de escritório que encontrei logo ali para ler um manuscrito posto ao lado da sua pena criadora.

É um poema de amor, e é uma mulher livre quem escreve suas linhas, dizendo como é feliz nas entranhas por ter todo dia dentro de si a expectativa de poder amar um novo alguém.

Sorrio e aperto o papel entre os dedos, sentindo a carícia sutil de um negro animal de pelos duros e quentes sobre minhas canelas.

Olho pra baixo e sorrio ao reconhecer o gato magro que ontem vi de relance, poucos minutos depois de adentrar nessa alcova cálida pela primeira vez.

Deixo o papel na mesa, pego o felino no colo e com meus dedos enfurnando em seu morno ronronar, ando alguns passos silente, cruzando roupas esticadas em um varal cheirando a amaciante e anil.

Gosto da tessitura gélida dos tecidos umedecidos sobre meus rosto enquanto avanço, e fecho os olhos caminhando para que a suavidade penetre em todo seu flavor o meu sentir.

Cruzo a última das peças daquele fresco obstáculo e então o brilho que entra nos meus olhos por entre as pálpebras desenha a silhueta daquela que chamo de meu amor.

Linda, branca e esbelta, manipula utensílios e colheres com seu queixo apontando as panelas de forma delicada, quase uma pintura da própria Vênus em nascimento dentre as brumas do mar sem fim.

Distraída entre seus temperos e mexidas e salteios de objetos, levanta as sobrancelhas num belo sorriso de lábios fechados e me observa de canto de olhos, tão linda e bem desenhada que não tenho dúvidas de que as mulheres são feitas quase sempre das pétalas de uma flor já há muito extinta de triste cor.

Então deixo o gato descer do colo, e inclinado pelo trato do bicho aproveito o movimento amplo e subo as mãos em suas belas pernas macias, que não apresentam resistência aos meus afagos, senão incrivelmente apenas por um grande camisetão com fragrância de um antigo sono bom.

Subo suas coxas, descobrindo seu quadril em curva perfeita, e num passo preciso de tango encaixo-me entre suas escápulas abraçando-a vigorosamente com meus pulsos postos em cruz.

Meu nariz fica em seus cabelos, sedosos, devo logo dizê-lo, e quando inspiro sinto morango, framboesa e frutas frescas em um bosque de chuveiro quente de algum tempo antes do meu acordar.

Balbucio coisas bobas, talvez um elogio sobre seus cílios ou a maciez dos seus joelhos.

Ela sorri e diz que o almoço já vem, e que se eu for paciente e cooperativo, talvez ganhe uma sobremesa mais que recompensadora para os lábios mais exigentes.


Faço cara de interrogação, e ela prontamente pega minha mão, e levantando sua camiseta, posiciona-a bem apertada contra sua virilha, lisa, quase tão lisa quanto macio pode ser um chiclete de bola Babaloo.

Então, sussura esfregando seu pescoço em minha barba por fazer... "estou quase pronta, tão pronta, que não sei se vai dar tempo de te servir"... meu membro fica excitado quando percebo o lubrificar efusivo e repentino na minha mão aprisionada, que mal tenho tempo de desligar as panelas enquanto ela se entorce no seu eixo para me encher de beijos, língua e gemidos que nunca dantes navegante havia ouvido de boca feminina alguma.

Revidei com um pegar no colo ajeitado, e fazendo caminho diferente por outros amplos corredores, fiz ela de projétil em um velho sofá de couro que testemunhava meu aleatório cambalear.

Ela me recebeu com membros ágeis, e com atos e gestos certeiros e apaixonantes chegamos finalmente no nosso inevitável êxtase carnal.

Estremecimentos, empasmos, fluídos e um relaxar calmante de músculos culminou no depósito dos nossos corpos suados paralelos no sofá largo, escuro, experiente em assentar pessoas mas definitivamente ingênuo daquela insólita demonstração de paixão entre dois corpos movendo-se na horizontal.

Ficamos parados, suspensos, respiração ofegantes, até o silêncio total.

Quebrou ela o silêncio com uma gargalhada profusa, que acabou sendo acampanhada pela minha, mais porque fui contagiado pela sua alegria que pelos seus motivos reais.

Então ela disse algo sobre seu filé, amaciado em uma receita secreta de família ter virado agora uma sola de sapato, e que o melhor que podíamos fazer seria transformá-lo em pedaços e fazer dele um mediano canapé.

Sola de sapato vira canapé... repetia entrecortada em engasgos do seu riso efusivo, até que sem ar parou com olhos fechados e grande boca perfeita em posição de dormir.

Mas era só fingimento, e do nada se  vira criança para mim e pergunta infantil, que faremos da tarde daquele manhoso domingo?

Penso no mar, no mundo, nas nuvens de um céu de chuva que aceitam alegres pássaros cheios de ousadia e primavera e então minha mente vai para o cosmos, o universo, para só então voltar ao lado dela no sofá.

Ela pergunta curiosa e careteira: que está pensando, criatura?

E eu contente, aliviado com a existência da vida e do que ela proporciona, digo pausado, calmo, mas definitivo: "A tarde já está sendo feita, querida. Aqui e agora, em nós."

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Sensação de solitude

Estava sentado num banco de praça, comendo pipoca e vendo nos pedriscos com cheiro molhado um bando de pompos que sabem que é domingo e vieram namorar.


Fecho os olhos e sinto a brisa fria, com jeito miúdo, porque o tempo é de chuva mas o Sol achou jeito de numa fresta esquentar a madeira do meu banco.


Passarinhos cantam um grugrulho, os carros passam silentes, o gosto que sinto é de manteiga na boca e o cheiro fresco traz de longe um café coado naquela hora ao nariz.


Queria agradecer a tudo e a todos, ao universo, ao sorriso das pessoas que alegres caminham de mãos dadas, as flor que acordam moles amarelas e laranjas nessa primavera, e a você, que pensa em mim com dedos indicador e médio da mão direita em seu coração.


Aqui nessa praça, sou astronauta no cosmos das minhas emoções e pretendo agir e girar, e viajar, gargalhando em mim mesmo as gotas de água que caem das árvores, estrelas brilhantes atiradas nas pálpebras parabrisas da desvairada imaginação.

Quem é feliz, feliz realmente, sabe que só se ama incondicionalmente, quando se aprende a amar só. Quem tem medo da solidão não atinge o verdadeiro coração, nem conhece a beleza mágica da solitude. Que domingo incrível será sua vida quando a solitude conseguir encontrar!

um exemplo, o sol.

eu amo o sol porque ele me dá luz.
seu calor faz o mar ficar morno.
os cataventos giram felizes num dia quente de sol.
a cor que os capachos têm são mais dinâmicas quando um gato de pelos quentes roça suas unhas neles.
o sol é bom, e eu amo o sol.
mas também odeio o sol, porque nem tudo são girassóis.
existem coisas que não deveriam ser vistas a sua luz.
a maldade fica bela na sua presença, e isso não é bom.
crianças machucadas tem seus sangues vermelhos expostas na sua claridade,
e as sombras tem medo de queimar-se em sua presença,
sempre se escondendo atrás das pedras e árvores.
odeio o sol pela sua transapência e força,
porque ele impõe absoluto a sua vontade.
e tudo morre se a sua implacável presença é alongada.
amo odiar aquilo que odeio amar demais
um exemplo? o sol.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Avança mais quem não teme o erro.

Alguém que leia sobre os primeiros linguistas no livro de Suassurre  pode ter algumas idéias.

Elas partem do fato de que esses homens da ciência tinham muito pouco material para trabalhar em seus tempos primordiais, e suas conjecturas invariavelmente levavam-nos para caminhos duvidosos.

Mas eles não desistiam, e ao contrário do senso comum, os erros publicados tornaram esses pioneiros eminências de difícil contestação em suas atividades.
Dai a conclusão de que o grande problema dos tempos modernos é o medo de errar, justamente porque o excesso de informação e das diversas fontes já consagradas de aprendizagem que deveriam ajudar nas pesquisas acabam justamente tendo o efeito contrário de gerar o temor do erro e de ser desmascarado por seus pares, tornando assim os novos pesquisadores míopes criativos que nada mais fazem que avançar pequenos passos em cima das grandes estruturas de conhecimento construídas pelos grandes clássicos.

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Enfrentando problemas

Mudar a realidade não é fácil, mas no mínimo tentador. Levando idéias aos órgãos competentes, correndo atrás dos nossos direitos como cidadãos, denunciando as coisas erradas que vemos por aí já é um começo. É claro que sermos apenas meros espectadores das mudanças é menos propenso a novos problemas, mas se pessoas antes da gente tivessem aceitado o desafio de resolver esses em epocas remotas quando ainda eram pequenos, hoje eles não existiriam. E se deixarmos passar nossa oportunidade de ajudar agora.... maiores serão para nossos filhos, e colossais para os nossos netos!

Imposto zero ajuda? Claro!

Qualquer projeto que vise a isenção de tributos para itens essenciais merece no mínimo especial consideração. Além de prover acesso a recursos que deveriam ser acessíveis por todos os cidadãos, é possivel dessa forma mitigar o custo das cadeias produtivas, elevando em longo prazo os recursos para o estado, indústria e população em geral. Sistemas menos custosos tendem a ser sustentáveis, e evitam aportes externos de recurso. Essa forma de pensamento evita ciclos viciosos de manutenção e distribuição de dinheiro vital para outras áreas que poderiam ser incentivadas até tornarem-se elas mesmas sustentáveis no futuro. Além do exemplo do transporte público gratuito, sugiro o da redução expressiva de impostos sobre materiais esportivos. A princípio, o estado iria perder arrecadação, mas a longo prazo o nosso sistema de saúde seria menos dispendioso, seja pela prática regular de atividades físicas que reduz o índice de doenças cárdiovasculares e decorrentes de stress, seja porque incitaríamos uma série de empregos indiretos em um setor que a mão de obra tende a ser oferecida por pequenas e médias empresas, essas geradoras eficientes de grande cadeia indireta empregatícia.

Bolsa sociais são um atraso para o país?

    Uma vez, li num livro barroco de autoria anônima que as mesmas flores que dão nectar para as abelhas produzirem delicioso mel, servem para as criaturas peçonhentas como insumo para a manufatura de poderoso veneno.
    Ou seja, os recursos podem ser manipulados pelas pessoas da forma que acomodem seus interesses, independente da roupagem que seus ideais sejam apresentados.
    O imposto é o recurso que o Estado arrecada dos seus cidadãos para se fazer cumprir as ações inerentes à sua função. Com esse recurso é possível acabar com a miséria e pobreza, desenvolver regiões menos favorecidas e assim conseguir um benefício maior para toda a população. É bom ser abastado e é difícil repartir recursos limitados para pessoas e áreas carentes que aparentemente não têm ligação com nossos familiares ou semelhantes próximos. Mas é através do sucesso pleno de toda a nação que poderemos elevar os nossos próprios ganhos, garantindo formas para que possamos nos elevar individualmente a novos patamares de qualidade de vida.

    Se refletirmos, veremos que é assim que funciona o Estado brasileiro trabalha na promoção na redução das desigualdades, e que atacar as formar e os recursos utilizados para se realizar um bem é no mínimo ingênuo, se desconsiderarmos as reais intenções por trás das intenções.
     Como exemplo, podemos citar a bolsa família, que ajuda uma parcela carente da população através de determinada parcela de nossos impostos. Alguns críticos dizem que o dinheiro empenhado nessa tarefa é desperdiçado, porque tem finalidade eleitoreira. Outros podem dizer que esses recursos não voltam como giro de capital, e por isso não se sustenta a longo prazo. Mas é fato que se essa política de redistribuição de renda for bem aplicada, tiraríamos pessoas que nesse momento não produzem para um lugar ao sol junto ao mercado de consumo, o que aumentaria a riqueza do país como um todo, favorecendo nosso comércio, indústria e consequentemente geraríamos empregos de qualidade com maiores remunerações.
       Agora, a forma como isso é feito pode e deve ser analisado criteriosamente. É dever dos cidadãos fiscalizar e emitir opiniões construitivas, buscando que do mel dos recursos produza-se o mel do bem estar social. Porque o perigo do veneno da corrupção e dilapidação das divisas existirão sempre, nesse programa ou em qualquer outro apresentado por qualquer partido que venha a liderar nosso país através das eleições.

A responsabilidade da cidadania

Ser inconformado é não aceitar a ordem das coisas, tal qual nos é apresentada. Mas a grande questão, ao que me parece, é como podemos nos utilizar da força do inconformismo, vital para a evolução da vida, de forma que possamos atingir algum progresso. Ou seja, não gastarmos a força de ação do nosso inconformismo apenas com gestos inócuos de indignação ao sistema ou culpando ao próximo por coisas que nós mesmos poderíamos resolver no dia-a-dia?
A população brasileira não é acomodada, como dizem, no ponto de vista do seu potencial de se inconformar. O problema é que ela não tem tradição de buscar por ações que solucionem seus problemas diários. Talvez por uma questão histórica paternalista desde os tempos do império, gostamos de transferir a responsabilidade das nossas mazelas aos nossos líderes, esquecendo que a cidadania provem de cada um de nós.
O conhecimento do Estado é sim muito importante, mas ainda mais importante é conhecermos nosso papel como protagonistas no sistema político-social em que vivemos. O dever de que as coisas funcionem não é de uma determinada parcela da população privilegioada ou detentora dos poderes atribuídos ao Estado, mas de todos que integram essa entidade e exercem suas escolhas através do voto consciente.
O dia em que cada brasileiro chamar para si a função de ajudar sua comunidade local, desde a reciclagem de lixo à prudência em economizar recursos e zelar pelos bens públicos, nossa inconformação será plenamente saudável a ponto de gerar energia para o progresso da nossa nação, mantendo a devida ordem para a busca da nossa felicidade em meio à essa grande aldeia global chamada planeta Terra.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Sobre a educação

 Montaigne: mais vale uma cabeça bem-feita que bem cheia

Estratégias de Manipulação das Mídias

 citações do livro 'Armas silenciosas para guerras tranquilas':



A estratégia da distração
O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundações de contínuas distrações e de informações insignificantes. A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir ao público de interessar-se pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. "Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja como os outros animais (citação do texto 'Armas silenciosas para guerras tranquilas')".

Para fazer com que se aceite uma medida inaceitável, basta aplicá-la gradativamente, a conta-gotas, por anos consecutivos. É dessa maneira que condições socioeconômicas radicalmente novas (neoliberalismo) foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990: Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que haveriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.
Outra maneira de se fazer aceitar uma decisão impopular é a de apresentá-la como sendo "dolorosa e necessária", obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Em seguida, porque o público, a massa, tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que "tudo irá melhorar amanhã" e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isto dá mais tempo ao público para acostumar-se com a ideia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegar o momento.


A maioria da publicidade dirigida ao grande público utiliza discurso, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade, como se o espectador fosse um menino de baixa idade ou um deficiente mental. Quanto mais se intente buscar enganar ao espectador, mais se tende a adotar um tom infantilizante. Por quê? "Se você se dirige a uma pessoa como se ela tivesse a idade de 12 anos ou menos, então, em razão da sugestão, ela tenderá, com certa probabilidade, a uma resposta ou reação também desprovida de um sentido crítico como a de uma pessoa de 12 anos ou menos de idade.
Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional, e por fim ao sentido critico dos indivíduos. Além do mais, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para implantar ou enxertar ideias, desejos, medos e temores, compulsões, ou induzir comportamentos.
Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. "A qualidade da educação dada às classes sociais inferiores deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que paira entre as classes inferiores às classes sociais superiores seja e permaneça impossível para o alcance das classes inferiores 
Levar o público a crer que é moda o fato de ser estúpido, vulgar e inculto.

Fazer o indivíduo acreditar que é somente ele o culpado pela sua própria desgraça, por causa da insuficiência de sua inteligência, de suas capacidades, ou de seus esforços. Assim, ao invés de rebelar-se contra o sistema econômico, o individuo se auto-desvalida e culpa-se, o que gera um estado depressivo do qual um dos seus efeitos é a inibição da sua ação. E, sem ação, não há revolução!
No transcorrer dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência têm gerado crescente brecha entre os conhecimentos do público e aqueles possuídos e utilizados pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o "sistema" tem desfrutado de um conhecimento avançado do ser humano, tanto de forma física como psicologicamente. O sistema tem conseguido conhecer melhor o indivíduo comum do que ele mesmo conhece a si mesmo. Isto significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos do que os indivíduos a si mesmos.